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domingo, 14 de maio de 2017

UM ESPELHO PARA O MUNDO E AS SÉRIES DE TV !






NAÇÃO & RAÇÃO !


INT. SALA DA CASA - DIA
A sala é impecável, aparentemente pertence à uma família de classe média alta de São Paulo. Estão sentados no sofá JOÃO, 43 anos, roupas impecáveis e com muita postura e MARCELA, 35 anos, bem vestida, unhas feitas, maquiada. Os dois assistem à um programa de televisão e sorriem.
MARCELA - Onde está o Joãozinho?
JOÃO - Eu não sei. Ele disse que ia pintar só dentro do quarto dele.
MARCELA - (ficando nervosa) - Pintar? E a roupa dele? Será que
ele vai se sujar?
JOÃO - Calma. Eu não achei que isso fosse ser tão ruim assim.
MARCELA - Não achou? Como não achou? Esqueceu como passamos fome no mês passado por causa dessas tintas?
JOÃO - Isso não vai acontecer, Marcela. Eu trabalhei muitas horas a mais esse mês.
MARCELA - Você sabe que isso não faz diferença.
JOÃO - E ele está no quarto dele. Ninguém vai ver que a camisa está suja. SE estiver suja.
(JOÃOZINHO entra na sala, vestido com uma camisa social manchada de tinta. Marcela se desespera.)
MARCELA - Ai meu filho, onde é que você estava?
JOÃOZINHO - Só fui brincar na rua, mamãe.
MARCELA - Na rua? Com essa roupa assim?
JOÃOZINHO - (perccebendo a tinta em sua roupa) - Não foi nada.
(Marcela olha angustiada para João, que se levanta sem graça.)
JOÃO - Eu... eu vou fazer umas ligações.
(João sai da sala.)
JOÃOZINHO - Eu tô com fome, mamãe. O que tem pra hoje?
MARCELA - Eu não sei. Alguma coisa deve ter sobrado ainda... você sabe que cada vez que a gente pinta uma parede, recebemos menos comida.
JOÃOZINHO - Eu sei, mas eu nunca mais pintei do lado de fora.
MARCELA - Ainda não é o suficiente, filho. As pessoas não tem que pintar nada. Como é que ainda permitem a venda dessas tintas?
(João chega na sala e percebe a aflição de Marcela.)
JOÃO - Sem elas, o que vai sobrar pra gente colorir as coisas?
(Marcela parece não dar atenção ao que o marido fala e mantém com seu olhar angustiado.)
MARCELA - Conseguiu ligar?
(João tem uma expressão muito triste.)
JOÃO - Sim.
MARCELA - Não... por favor não...
JOÃO - Eu vou tentar negociar ainda, talvez eles aceitem... talvez se eu dobrar as horas de trabalho...
MARCELA - Você sabe que eles vão transformar isso em sua obrigação.
JOÃO - E o que você quer? Morrer de fome?
(Marcela, quase chorando, abraça seu filho.)
MARCELA - Quantas horas de trabalho você já não aumentou?
JOÃO - Eu só queria que o Joãozinho tivesse uma infância feliz... ele
só gosta de pintar, isso não é nenhum crime.
MARCELA - Você sabe que já faz alguns anos que isso se tornou crime.
JOÃO - Por deus, Marcela, ele é só uma criança.
JOÃOZINHO - O que tá acontecendo, gente?
MARCELA - Você não entendeu ainda? A gente vai receber pouca comida esse mês... de novo.
JOÃO - Não, Marcela. Eles cortaram tudo dessa vez.
MARCELA - Como assim tudo?
JOÃO - Não vai ter comida esse mês pra nós. E se descobrirem que alguém nos ajudou, você já sabe o que vai acontecer...
(João sai da sala chorando. Marcela abraça seu filho, desesperada.)
JOÃOZINHO - Eu tô com fome... desculpa, mãe, eu não vou mais pintar nada.
(João volta com meio pão, pratos e talheres requintados. Ele divide o pão em três.)
JOÃO - Desculpa, filho. Nem todo mundo vê as cores do mesmo jeito que você.
Cada um pega o seu pedaço de pão e começa a comer. Mantendo a elegância, mas todos angustiados.



Realizado pelo grupo de estudos !


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