Segundo Michel Foucault, “meu corpo é o contrário de uma utopia, é o que jamais se encontra sob outro céu, lugar absoluto, pequeno fragmento de espaço com o qual, no sentido estrito, faço corpo”.
O
corpo define o Homem como um ser singular, único em sua jornada existencial.
Existe no espaço tempo, é territorial, tem lugar, habita a matéria, e para
sobreviver, subverte todo tipo de utopia, por estar marcado pela concretude de
seus movimentos. O corpo torna-se uma topia implacável, que não transcende a
sua própria existência.
A
parte do Homem que transcende a matéria cria as utopias, e cria um corpo
incorporal, uma utopia que apaga os corpos, e faz do corpo algo para além de
sua existência material.
Segundo
Michel Foucault, “Essa utopia é o país
dos mortos, são as grandes cidades utópicas que nos foram deixadas pela
civilização egípcia. Afinal, o que são as múmias? Elas são a utopia do corpo
negado e transfigurado. A múmia é o grande corpo utópico que persiste através
do tempo.”
A
utopia do corpo é construída para transformá-la em uma alma, eterna, luminosa,
purificada, virtuosa, ágil, móvel, tépida, viçosa, lisa, castrada. O sentido
máximo da existência, imortal, sem limites e fim. A utopia nasce do corpo, com
a necessidade de sobreviver a tudo e estar para além de uma existência
material.
Para Michel Foucault, “ o corpo humano é o ator principal de todas
as utopias”.
O Homem cria a utopia a partir da
topia, não se tira algo do nada, mas tira-se algo do que já existe e transforma
o material em algo imaterial. O Homem transcende a partir do corpo, que mesmo
mortal, ao fazer parte de uma utopia, eterniza os movimentos humanos, presente
na construção de sua transformação.
Segundo Michel Foucault, “a máscara, a tatuagem, a pintura instalam o
corpo em um outro espaço, fazem-no entrar em um lugar que não tem lugar
diretamente no mundo”.
O Homem cria a utopia para viver em seu
corpo para além da materialidade, transporta o corpo de seu espaço de origem e
o situa no espaço criado pela sua utopia. O mundo deste corpo deslocado já não
é o mundo da topia, mas é o mundo para além do mundo material, torna o que é
mortal em algo imortal.
O corpo se metamorfoseia sem deixar de
ser corpo, trazendo ao Homem sensações, experiências, situações que criam
caminhos para o mesmo destino, que é a morte.
É no ato do amor que o corpo é corpo,
capaz de viver o que está além do corpo. Na sua topia utópica passa a existir com
toda plenitude, ao ponto de se multiplicar e perpetuar no tempo.
Para Michel Foucault, “seria talvez necessário dizer também que fazer
amor é sentir o corpo refluir sobre si, é existir, enfim, fora de toda utopia,
com toda densidade, entre as mãos do outro”.
O meu corpo não é apenas meu, mas
também é seu, é nosso corpo, unido pela mesma topia, à certeza de que temos o
mesmo destino, e por uma questão de sobrevivência criamos utopias para a
continuidade da vida. Já não basta ser único, temos que partilhar o que há de
mais humano e corporal, a morte. Que mostra o limite da topia, enquanto a utopia
é imortal, não tem limites, por estar para além da materialidade do corpo. E
contra o fim, o corpo se revolta, subverte a ordem, cria a sua própria utopia,
mesmo que ela venha a revele-se como uma topia. Mesmo finito o corpo quer ser infinito,
e é assim que perpetua a espécie humana finita.
Fonte:
Michel Foucault – O Corpo Utópico
Nenhum comentário:
Postar um comentário