1ª
Ato:
O Estudo como caminho para ter um bom Amigo
A
partir da cultura oriental vamos conhecer caminhos para sermos bons amigos,
aperfeiçoarmos eticamente, o que passa tanto pela instrução formal quanto pela
convivência com pessoas de ideias comuns. Estudar não significa somente a busca
de conhecimento, mas um caminho, um método que pode resolver, ao mesmo tempo,
problemas morais, éticos e sociais, como harmonizar as relações sociais.
- O Mestre: Aprender algo e depois poder praticá-lo com regularidade,
isso não é um contentamento? Se amigos vêm de lugares distantes, isso não é uma
alegria? Se pessoas não reconhecem meu valor, e eu, apesar disso, não sinto
rancor, isso também não é característica do Homem Nobre?
- O Discípulo: Passamos uma vida estudando e quando podemos saber que
estamos prontos para praticar o que aprendemos?
- O Mestre: Tanto o processo de estudar como seu resultado de
aprender estão unidos, o que significa que aquilo que se estuda deve
necessariamente ter uma utilidade definida, e isso só pode ser atingido por
meio de uma prática regular.
- O Discípulo: E o que tem haver estudo com o amigo?
- O Mestre: Amigo é aquele com quem se têm ideias comuns.
- O Discípulo: Para eu achar um amigo na vida devo conhecer alguém
que tenha as mesmas ideias que eu, os mesmos gostos e desejos?
- O Mestre: As coisas que possuem a mesma natureza permanecem juntas.
- O Discípulo: Estou confuso, como posso distinguir os conhecidos dos
amigos, e os amigos dos amigos de verdade?
- O Mestre: Pelo grau da similaridade de suas naturezas.
- O Discípulo: Quanto mais amigo, mais similar.
- O Mestre: Se você é estudioso, busca um modelo de perfeição, será
com essas pessoas que você formará amizade.
- O Discípulo: Além do senhor, não conheço muitas pessoas assim?
- O Mestre: Para ser nobre tem que atingir uma dimensão ética e ao
mesmo tempo uma dimensão social. Para o desenvolvimento moral do indivíduo,
estudar basta. O que pode trazer o desenvolvimento psicológico do indivíduo.
- O Discípulo: Então serei amigo da pessoa com a qual consigo me
relacionar de forma elevada e profunda, conforme o meu grau de instrução. Se eu
for nobre, terei amigos nobres.
- O Mestre: Os que têm conduta Filial e Fraterna em casa, mas
costumam ofender seus superiores na sociedade, pessoas assim são raras. Os que
contrariam seus superiores, mas gostam de causar tumulto, pessoas assim nunca
existiram. O Homem Nobre esmera-se no que há de fundamental: uma vez os
fundamentos estejam estabelecidos, surge então o Caminho. Ser Filial e
Fraterno, não são esses os fundamentos do agir com Humanidade?
- O Discípulo: Para ser Humano tem que ser Nobre, e uma pessoa não
pode Ser e Não-ser. Ou sou Humano, ou não sou Humano. A educação me dá os
fundamentos para conhecer o Caminho.
- O Mestre: É no conhecimento do caminho para ser humano é que mantém
a Ordem por intermédio dos deveres éticos sociais imprescritíveis.
- O Discípulo: Mas manter a Ordem em muitos casos é a afirmação do
poder vigente, que pode ser um poder opressor do povo. Como mudar a vida sem
fazer uma revolução?
- O Mestre: A afirmação das autoridades superiores e dos regimes
políticos vigentes ocorre em decorrência da natureza das relações humanas.
Aprende-se primeiramente em casa, assim, devemos fazer a seguinte pergunta:
Como são as relações humanas em sua casa?
- O Discípulo: Eu estou aprendendo a valorizar a minha casa, fora de
casa, ao estudar e tentar ter atitudes nobres na vida, percebo o quanto a minha
vida familiar é importante para me formar para a vida.
- O Mestre: Na sua maioria, os primeiros verdadeiros amigos de uma
pessoa são os próprios pais, com todas as suas limitações e privações impostas
pela vida. São eles que geram a vida e lutam pela sobrevivência do filho.
- O Discípulo: Às vezes buscamos os amigos em nossas relações sociais
e esquecemos os nossos próprios pais.
- O Mestre: A Filialidade e Fraternidade envolvem o dever não apenas
de amar e cuidar de pais e irmãos mais velhos, mas o dever de obediência e
submissão.
- O Discípulo: Mas o Homem para ser livre não tem que ser capaz de
subverter a Ordem, o que muitas das vezes impede exercer os dever da obediência
e submissão?
- O Mestre: É através da obediência e submissão que a sociedade se
beneficia do prolongamento da hierarquia existente na estrutura familiar, de
modo que os que estão acima são como pais ou irmãos mais velhos.
- O Discípulo: Então o indivíduo não pode se rebelar ou desobedecer
civilmente? Como as minorias oprimidas fazem para protestar e reivindicar os
seus próprios direitos?
- O Mestre: A ordem social deve espelhar a Harmonia familiar.
- O Discípulo: Então para os indivíduos que não tem uma Harmonia
familiar, ou seja, suas famílias são desestruturadas, não há ordem social?
- O Mestre: Para os indivíduos que não tem a oportunidade de aprender
em casa a obedecer e ser submisso aprende a ser na sociedade, através dos
instrumentos de repressão do Estado.
- O Discípulo: Assim, a vida é dura para as famílias desestruturadas,
seus membros sofrem muito por não aprenderem um caminho para viver.
- O Mestre: O dever para com os pais e os irmãos mais velhos é a raiz
do arranjo social, todas as outras relações são projetos do mundo familiar.
- O Discípulo: Mas será possível ter um dever para com os pais, e
outro dever para com a sociedade, ter relações sociais diferentes das do mundo
familiar? Como podemos ter uma atitude de vanguarda e assim evoluir? Qual é o
caminho?
- O Mestre: O surgimento do Caminho é consequência de uma sociedade
em que os deveres de Filialidade e Fraternidade estão universalmente
estabelecidos.
- O Discípulo: Mas o que é universal? Se o que é importante para mim,
pode não ser importante para o outro?
- O Mestre: Universal são os valores que são importantes para todos.
- O Discípulo: Se duas ou mais pessoas dão valor a mesma ideia, visão
de mundo, essas ideia é universal?
- O Mestre: Um exemplo é a Filialidade e a Fraternidade que são o
caminho que leva à Ordem, isto é, o meio para atingir a harmonia das relações
sociais. Um valor universal por ser desejado por muitos indivíduos, às vezes
não todos os indivíduos.
- O Discípulo: O indivíduo para ser Humano tem que ser Filial e
Fraterno?
- O Mestre: A Filialidade e a Fraternidade são um dos aspectos que
determina o que é a Humanidade, seu conteúdo e virtude ética, um atributo do
Homem Nobre.
Referência:
CONFÚCIO. Os Anelectos;
tradução: Giorgio Sinedino. – São Paulo: Folha de S. Paulo, 2015